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O Jardim das Aflições de Josias Teófilo

Mar­can­do o iní­cio da últi­ma sema­na de pro­jec­ções cine­ma­to­grá­fi­cas, o pro­jec­to Fusões no Cine­ma vem des­ta vez pro­jec­tar na tela a car­ga filo­só­fi­ca que pode estar impres­sa na pelí­cu­la. Este docu­men­tá­rio rea­li­za­do por Josi­as Teó­fi­lo vai ao encon­tro do uni­ver­so de Ola­vo de Car­va­lho e da cons­tru­ção dos seus argu­men­tos filosóficos.

O pen­sa­men­to de Ola­vo de Car­va­lho per­so­ni­fi­ca­do pela sua pre­sen­ça, roti­na de tra­ba­lho e con­ví­vio fami­li­ar na Vir­gí­nia (EUA), onde mora atu­al­men­te. O fil­me par­te dos temas do livro homô­ni­mo que ele publi­cou em 1995, tais como o sim­bo­lis­mo dos jar­dins na tra­di­ção filo­só­fi­ca, liber­da­de indi­vi­du­al e opres­são do cole­ti­vo, o pen­sa­men­to aris­to­té­li­co, e che­ga a um dos temas cen­trais do seu pen­sa­men­to: a mor­te e a filo­so­fia – aque­las idei­as que con­ti­nu­am sen­do impor­tan­tes para nós em face da mor­te – ten­do como mote a per­gun­ta: “O que você vai fazer com a sua vida enquan­to é tempo?”.

A ses­são ocor­re­rá no dia 18 de dezem­bro às 22:00 e a entra­da no Mini-Audi­tó­rio Sal­ga­do Zenha é livre. 

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Pessoanos comentam o “Filme do Desassossego”

Na pró­xi­ma quin­ta-fei­ra, 2 de Novem­bro, o Mini-Audi­tó­rio Sal­ga­do Zenha irá rece­ber a exi­bi­ção do “Fil­me do Desas­sos­se­go” de João Bote­lho. Este fil­me é base­a­do no livro homó­ni­mo da auto­ria dos hete­ró­ni­mos, de Fer­nan­do Pes­soa, Ber­nar­do Soa­res e Vicen­te Gue­des. O livro ina­ca­ba­do de Fer­nan­do Pes­soa tem conhe­ci­do vári­as edi­ções com­pi­la­das atra­vés da inter­pre­ta­ção de vári­os edi­to­res dos manus­cri­tos e dac­ti­los­cri­tos ori­gi­nais e das inten­ções escri­tas de orga­ni­za­ção de Fer­nan­do Pes­soa. Cada edi­ção é uma nova pers­pec­ti­va sobre esta obra, o que pode­rá acres­cen­tar o filme?

Para res­pon­der a esta per­gun­ta con­ta­mos com a pre­sen­ça de três peri­tos na obra de Fer­nan­do Pes­soa; Antó­nio Apo­li­ná­rio Lou­ren­ço, Bru­no Fon­tes e Manu­el Portela.

Antó­nio Apo­li­ná­rio Lourenço

Antó­nio Apo­li­ná­rio Lou­ren­ço é pro­fes­sor de lite­ra­tu­ra na Uni­ver­si­da­de de Coim­bra, onde coor­de­na a sec­ção de Estu­dos Espa­nhóis. Inte­gra a Comis­são Exe­cu­ti­va do Cen­tro de Lite­ra­tu­ra Por­tu­gue­sa da mes­ma uni­ver­si­da­de. É autor ou edi­tor de vári­os livros publi­ca­dos em Por­tu­gal, Espa­nha e Bra­sil, entre os quais uma His­tó­ria da Lite­ra­tu­ra Espa­nho­la (1994, em cola­bo­ra­ção com Eloí­sa Álva­rez), uma His­to­ria de la Lite­ra­tu­ra Por­tu­gue­sa (2000, coe­di­tor, com José Luis Gavi­la­nes), Iden­ti­da­de e alte­ri­da­de em Fer­nan­do Pes­soa e Anto­nio Macha­do (1995; com edi­ção espa­nho­la de 1997), Eça de Quei­rós e o Natu­ra­lis­mo na Penín­su­la Ibé­ri­ca (2005), Estu­dos de lite­ra­tu­ra com­pa­ra­da luso-espa­nho­la (2005), Fer­nan­do Pes­soa (2009), Guia de lei­tu­ra. Men­sa­gem de Fer­nan­do Pes­soa (2011), Lite­ra­tu­ra, Espa­ço, Car­to­gra­fi­as (2011, coe­di­tor, com Osval­do Manu­el Sil­ves­tre), Pode­res y Auto­ri­da­des en el Siglo de Oro: Rea­li­dad y Repre­sen­ta­ción (2012, coe­di­tor com Jesús M. Usu­ná­riz), O Sécu­lo do Roman­ce. Rea­lis­mo e Natu­ra­lis­mo na Fic­ção Oito­cen­tis­ta (2013, coe­di­tor com Maria Hele­na San­ta­na e Maria João Simões) e O Moder­nis­mo (2015, em cola­bo­ra­ção com Car­los Reis). A sua edi­ção comen­ta­da da Men­sa­gem de Fer­nan­do Pes­soa foi lan­ça­da no Bra­sil em 2015, na cole­ção de clás­si­cos da Ate­liê Editorial.

Bru­no Fontes

Bru­no Fon­tes licen­ci­ou-se em Estu­dos Por­tu­gue­ses e Lusó­fo­nos na Facul­da­de de Letras da Uni­ver­si­da­de de Coim­bra, e con­cluiu, na mes­ma ins­ti­tui­ção, o Mes­tra­do em Estu­dos Artís­ti­cos, na área de estu­dos fíl­mi­cos. Tem desen­vol­vi­do ati­vi­da­des em con­jun­to com diver­sas asso­ci­a­ções cul­tu­rais em Coim­bra, no Por­to e na Figuei­ra da Foz. As suas áre­as de inte­res­se cen­tram-se no diá­lo­go do cine­ma com as outras artes, das quais se des­ta­cam a lite­ra­tu­ra e a músi­ca, e na aná­li­se da arte e da cul­tu­ra de mas­sas na soci­e­da­de con­tem­po­râ­nea. Está nes­te momen­to a fre­quen­tar o Pro­gra­ma de Dou­to­ra­men­to em Mate­ri­a­li­da­des da Lite­ra­tu­ra na Uni­ver­si­da­de de Coimbra. 

Manu­el Portela

Manu­el Por­te­la é pro­fes­sor da Facul­da­de de Letras da Uni­ver­si­da­de de Coim­bra, onde diri­ge o Pro­gra­ma de Dou­to­ra­men­to em Mate­ri­a­li­da­des da Lite­ra­tu­ra (Pro­gra­ma de Dou­to­ra­men­to FCT). É mem­bro do Cen­tro de Lite­ra­tu­ra Por­tu­gue­sa da Uni­ver­si­da­de de Coim­bra, sen­do o inves­ti­ga­dor res­pon­sá­vel pelo Arqui­vo LdoD (https://ldod.uc.pt/), um arqui­vo digi­tal dedi­ca­do ao Livro do Desas­sos­se­go, a publi­car em 2017. O seu últi­mo­li­vro inti­tu­la-se Scrip­ting Rea­ding Moti­ons: The Codex and the Com­pu­ter as Self-Refle­xi­ve Machi­nes (MIT Press, 2013).

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LONGE DOS HOMENS de David Oelhoffen

Argé­lia, 1954. Enquan­to a revol­ta ribom­ba no vale, dois homens mui­to dife­ren­tes, reu­ni­dos por um mun­do em con­vul­são, são obri­ga­dos a fugir em con­jun­to pelas mon­ta­nhas do Atlas. A meio de
um inver­no gela­do, Daru, o pro­fes­sor soli­tá­rio, tem de escol­tar Moha­med, um aldeão acu­sa­do de homi­cí­dio. Per­se­gui­dos por homens a cava­lo que pro­cu­ram jus­ti­ça sumá­ria e colo­nos vingativos,
os dois homens deci­dem enfren­tar o des­co­nhe­ci­do. Jun­tos, lutam para obter a sua liber­da­de.  É exi­bi­do no Mini-Audi­tó­rio Sal­ga­do Zenha no pró­xi­mo dia 19 de Outu­bro às 22:00. A entra­da é livre.

Loop Detec­ted
Daru (Vig­go Mor­ten­sen) é um pro­fes­sor ide­a­lis­ta que ape­nas dese­ja aju­dar os seus jovens alu­nos a cres­cer e ter uma vida melhor. Um dia é obri­ga­do a escol­tar Moha­med (Reda Kateb), um aldeão acu­sa­do de homi­cí­dio, até à cida­de de Tin­guit, onde terá de ser entre­gue à polí­cia para jul­ga­men­to. Ape­sar da recu­sa ini­ci­al, Daru acei­ta a mis­são. Porém, per­se­gui­dos por homens que pro­cu­ram fazer jus­ti­ça pelas suas pró­pri­as mãos, os dois vêem-se per­di­dos no deser­to. Sem esco­lha, eles sabem que têm de con­ti­nu­ar o cami­nho, mes­mo cien­tes das pou­cas hipó­te­ses de sobre­vi­ver aos peri­gos da jornada…

Intro­du­ção Histórica

LONGE DOS HOMENS, do rea­li­za­dor fran­cês David Oelhof­fen, uma adap­ta­ção de um con­to, L’hôte, do filó­so­fo fran­co-arge­li­no Albert Camus – é um wes­tern inte­li­gen­te e de com­bus­tão lenta,
com uma ban­da sono­ra atmos­fé­ri­ca de Nick Cave e War­ren Ellis e uma inter­pre­ta­ção excep­ci­o­nal de Vig­go Mor­ten­sen. (…) Mor­ten­sen faz o papel de Daru, um pro­fes­sor san­to que tra­ba­lha na Argé­lia, em 1954, no come­ço da sua luta pela inde­pen­dên­cia dos fran­ce­ses. Daru ensi­na miú­dos numa esco­la minús­cu­la, no alto das mon­ta­nhas do Atlas, mas este homem tem cla­ra­men­te mais qual­quer coi­sa. O seu ros­to cur­ti­do pare­ce reti­ra­do das mon­ta­nhas por trás da esco­la e
sabe mane­jar uma arma quan­do sol­da­dos fran­ce­ses lhe tra­zem um arge­li­no local, Moha­med (Reda Kateb), que con­fes­sou ter mor­to um pri­mo, numa dis­cus­são sobre tri­go rou­ba­do. Sem mãos a medir com a luta con­tra os com­ba­ten­tes da liber­da­de arge­li­nos, os sol­da­dos pedem a Daru para entre­gar Moha­med ao tri­bu­nal, que fica a um dia de via­gem. Daru recu­sa, argu­men­tan­do que esta­ria a levar o pri­si­o­nei­ro para a sua mor­te. Mas quan­do os sol­da­dos par­tem e Moha­med se recu­sa a fugir, ele não tem mui­ta escolha.

O REALIZADOR

David Oelhof­fen nas­ceu em Fran­ça. Rea­li­zou as cur­tas-metra­gens LE MUR (1996), BIG BANG (1997), EN MON ABSENCE (2001), ECHAFAUDAGES (2004) e SOUS LE BLEU (2004) e a lon­ga-metra­gem NOS RETROUVAILLES (2007). LOIN DES HOMMES / LONGE DOS HOMENS (2014) é o seu últi­mo filme.

DECLARAÇÃO DO REALIZADOR

Des­de a pri­mei­ra lei­tu­ra do con­to de Camus, L’hôte, visu­a­li­zei um wes­tern. Um wes­tern não con­ven­ci­o­nal, é cer­to, impreg­na­do de his­tó­ria euro­peia e ten­do como fun­do as ter­ras altas do nor­te de Áfri­ca, mas ain­da assim um wes­tern. Fiel aos códi­gos, há colo­ni­za­do­res e colo­ni­za­dos, um pri­si­o­nei­ro a escol­tar e uma tra­ma que desa­gua em vio­lên­cia. No cen­tro da his­tó­ria e dos seus per­so­na­gens encon­tra-se uma coli­são entre dois sis­te­mas jurí­di­cos. Tes­te­mu­nha­mos duas cul­tu­ras e duas morais for­ça­das a coe­xis­tir pela his­tó­ria. Tinha sonha­do com ir bus­car o Vig­go Mortensen.
A sua sin­gu­la­ri­da­de encai­xa­va per­fei­ta­men­te no papel. Reda Kateb – mis­te­ri­o­so, opa­co e com os pés no chão – fun­ci­o­na­va como con­tra­pon­to per­fei­to. A pai­sa­gem desér­ti­ca assu­me o papel de
per­so­na­gem, na his­tó­ria. Sob a luz radi­an­te do nor­te de Áfri­ca, cons­ti­tuía uma com­pa­nhia bela mas impre­vi­sí­vel para o filme.
Adap­tar esta his­tó­ria ao cine­ma impli­ca­va dotar os per­so­na­gens de mais subs­tân­cia e tor­nar a nar­ra­ti­va mais den­sa. Uma das for­mas de o fazer foi incluir o con­tex­to arge­li­no e o come­ço da guer­ra. Mas a mai­or mudan­ça foi alte­rar a natu­re­za da rela­ção entre Daru e o jovem arge­li­no, que resul­tou num fnal cla­ra­men­te dife­ren­te para a his­tó­ria de Camus.
Sem­pre com a ideia de con­ser­var o espí­ri­to de , cujas pre­o­cu­pa­ções me pare­cem mui­to actu­ais: pre­o­cu­pa­ções acer­ca da huma­ni­da­de, a denúncia
da injus­ti­ça e, aci­ma de tudo, a dif­cul­da­de do com­pro­mis­so moral.
A tra­jec­tó­ria de Daru é tam­bém a de um homem que quer sal­var outro, ape­sar de ele ser um cri­mi­no­so, mas eu que­ria inten­si­fi­car a ener­gia que Daru des­pen­de a con­ven­cer o pri­si­o­nei­ro a não
obe­de­cer à lei da sua comu­ni­da­de, nem a entre­gar-se à igual­men­te injus­ta lei dos colonizadores.

Tam­bém ima­gi­nei um per­so­na­gem mais ator­men­ta­do e mal­tra­ta­do do que no ori­gi­nal, um homem que tinha vivi­do a guer­ra e que que­ria fugir à vio­lên­cia, um homem car­re­ga­do de pesar, que o impe­le a abri­gar-se da vida. E, por últi­mo, um homem com uma iden­ti­da­de dolo­ro­sa: filho de espa­nhóis, é um euro­peu e vis­to como tal pelos aldeões, mas não se esque­ceu de que, uma gera­ção antes, os seus pais anda­lu­zes eram con­si­de­ra­dos “ára­bes”.
No caso de Moha­med, eu sobre­tu­do não que­ria que o per­so­na­gem fos­se a figu­ra do ára­be per­tur­ban­te, tão mis­te­ri­o­so e opa­co como na his­tó­ria ori­gi­nal, mas antes um homem com as suas razões, a sua pró­pria moral e que se abre gra­du­al­men­te ao que Daru pro­põe – a pos­si­bi­li­da­de de agir por si, enquan­to indivíduo.

Notas da Crítica

LONGE DOS HOMENS des­car­na a nar­ra­ti­va, fica-lhe só com o osso, e esse “osso” é uni­ver­sal: um ter­ri­tó­rio não domi­na­do, qua­se sel­va­gem.” — Público

Fiel, não à letra, mas ao espí­ri­to de Albert Camus, do qual adap­ta um con­to, L’hôte, o cine­as­ta diri­ge os acto­res com uma deli­ca­de­za rara.” — Télérama

É, sim­ples­men­te, um gran­de wes­tern tra­di­ci­o­nal: a lín­gua e os deta­lhes cul­tu­rais podem ser dife­ren­tes, mas a ele­gân­cia espar­sa e os dile­mas morais são fami­li­a­res e tão suges­ti­vos como sem­pre (…). LONGE DOS HOMENS é, de for­ma dis­cre­ta, um fil­me gran­di­o­so e belo.” — Indiewire

O que faz com que fun­ci­o­ne é a efi­ci­ên­cia sole­ne com que o rea­li­za­dor David Oelhof­fen con­ta a his­tó­ria e a inten­si­da­de silen­ci­o­sa dos dois pro­ta­go­nis­tas: a ter­nu­ra rude do olhar de Mor­ten­sen con­tra­põe-se bem ao com­por­ta­men­to con­fli­tu­an­te de Kateb.” — New York Magazine

Camus esta­be­le­ce o rumo ini­ci­al do fil­me, mas Oelhof­fen leva‑o fir­me­men­te a bom por­to com con­tex­to polí­ti­co, aná­li­se his­tó­ri­ca retros­pec­ti­va, um impe­ra­ti­vo moral inequí­vo­co e um par de inter­pre­ta­ções bem empa­re­lha­das. Dito de outra for­ma, apro­pria-se da his­tó­ria. — New York Times

Ficha Téc­ni­ca

Títu­lo original
Loin des Hom­mes (Fran­ça, 2014, 101 min.)
 
Realização
David Oelhoffen
 
Interpretação
Vig­go Mor­ten­sen, Reda Kateb, Dje­mel Barek
 
Argumento
David Oelhof­fen, a par­tir da obra O Hós­pe­de de Albert Camus
 
Fotografia
Guil­lau­me Deffontaines
 
Montagem
Juli­et­te Welfling
 
Musica
Nick Cave e War­ren Ellis
 
Produção
Marc du Pon­ta­vi­ce, Matthew Gledhill
 
Classificação
M/12
 
Estreia em Portugal
6 de Agos­to de 2015
 
Distribuição
Alambique