Claude Chabrol

Cineasta francês Claude Chabrol faleceu aos 80 anos

Claude ChabrolO cine­as­ta fran­cês Clau­de Cha­brol, fale­ceu hoje, em Paris, aos 80 anos. Em decla­ra­ções à Lusa a actriz e rea­li­za­do­ra Inês de Medei­ros lem­bra um homem que “tinha um amor abso­lu­to pela vida e pelo cinema”.
“Para mim ele repre­sen­ta sobre­tu­do o amor abso­lu­to pelo cine­ma. Tinha uma neces­si­da­de abso­lu­ta de fil­mar, de retra­tar uma cer­ta soci­e­da­de”, apon­tou, a pro­pó­si­to do desa­pa­re­ci­men­to des­ta impor­tan­te figu­ra da Nou­vel­le Vague fran­ce­sa, a par de rea­li­za­do­res como Fran­çois Truf­faut e Jean-Luc Godard.Inês de Medei­ros des­ta­cou a “vas­ta obra” dei­xa­da por Clau­de Cha­brol e tam­bém o fac­to do cine­as­ta se ter espe­ci­a­li­za­do em temá­ti­cas mui­to pró­pri­as, como a da cru­el­da­de no seio fami­li­ar, e nos mei­os soci­ais mais fechados”.

Ele era tam­bém um bon vivant, gos­ta­va de comer bem e de beber bem. Ama­va tan­to a vida como o cine­ma”, des­cre­veu a auto­ra do docu­men­tá­rio “Car­tas a uma dita­du­ra” (2006).

Inês de Medei­ros real­çou igual­men­te o “tra­ba­lho extra­or­di­ná­rio” de Clau­de Cha­brol com algu­mas actri­zes, dan­do o exem­plo de Isa­bel­le Hup­pert, com quem tra­ba­lhou mui­to no final da vida, em fil­mes como “La Cére­mo­nie”, onde con­tra­ce­na com a actriz fran­ce­sa San­dri­ne Bonnaire.

Des­ta­cou ain­da a impor­tân­cia do rea­li­za­dor nas­ci­do em Paris, a 24 de Julho de 1930, no qua­dro do movi­men­to da Nou­vel­le Vague, “mas com um tra­ba­lho numa ver­ten­te mais romanesca”.

Sobre as influên­ci­as de Cha­brol no cine­ma por­tu­guês, Inês de Medei­ros ava­li­ou que “é per­cep­tí­vel” em rea­li­za­do­res como Fer­nan­do Lopes, “num cer­to olhar sobre a média e alta bur­gue­sia e até os segre­dos familiares”.

Clau­de Cha­brol rea­li­zou, entre outros, no iní­cio da car­rei­ra, nos anos 1950, “Le Beau Ser­ge”, “Les Cou­sins”, “À Dou­ble Tour”, e na últi­ma déca­da “A Dama de Hon­ra”, “A Comé­dia do Poder” e “A Rapa­ri­ga cor­ta­da em dois”.

Sati­ris­ta incansável

Apre­ci­a­dor da boa cozi­nha, de per­so­na­gens “mons­tru­o­sos” e de lite­ra­tu­ra, Cha­brol sim­bo­li­za “o cine­ma à fran­ce­sa”, ao mes­mo tem­po psi­co­ló­gi­co e soci­al, qua­se sem­pre com uma mar­ca sarcástica.

A sua vas­ta obra, cheia de iro­nia, dis­se­ca sem con­ces­sões, por vezes com cru­e­za e fero­ci­da­de, as zonas mais obs­cu­ras e abjec­tas da alma huma­na, mas tam­bém o deses­pe­ro dos seres huma­nos apa­nha­dos pela fata­li­da­de e apri­si­o­na­dos nos jogos de poder”, dis­se sobre ele Véro­ni­que Cay­la, pre­si­den­te do Cen­tro Naci­o­nal do Cine­ma, em Paris.

Em mui­tos dos seus fil­mes, fez incur­sões pela pro­vín­cia, usan­do uma cru­e­za iró­ni­ca para des­cre­ver os escân­da­los e segre­dos de famí­lia, denun­ci­an­do a hipo­cri­sia des­ti­na­da a pre­ser­var a res­pei­ta­bi­li­da­de de fachada.

Para o minis­tro da cul­tu­ra fran­cês, Fré­dé­ric Mit­ter­rand, Cha­brol era “um ana­lis­ta sub­til e feroz”, dota­do de um “olhar ao mes­mo tem­po mali­ci­o­so e ful­mi­nan­te”. “Era um incon­for­mis­ta por exce­lên­cia, um mes­tre da iro­nia”, disse.

Um seu pre­de­ces­sor no gover­no fran­cês, Jack Lang, descreveu‑o assim: “Nin­guém melhor do que ele sou­be ence­nar a hipo­cri­sia de uma cer­ta burguesia”.

Ape­sar de os fil­mes de Clau­de Cha­brol terem conhe­ci­do um gran­de suces­so entre o públi­co, não foi mui­to recom­pen­sa­do ao lon­go da car­rei­ra, excep­to por um Urso de Ouro atri­buí­do em Ber­lim em 1959 pelo fil­me “Les Cou­sins”, o pré­mio Jean Vigo, e o Gran­de Pré­mio do Fes­ti­val de Locar­no, por “Le Beau Ser­ge” (1957).

Esta últi­ma pelí­cu­la foi a pri­mei­ra que assi­nou e a que teve algu­ma impor­tân­cia para o sur­gi­men­to da Nou­vel­le Vague.